O Evangelho e o New Gospel

Em 1998 a Volkswagen "reinventou" o Fusca lançando o New Beetle, que na verdade é uma nova geração do bom e velho Fusca, porém com sensíveis diferenças que fazem dele um carro totalmente diferente, apesar da tentativa de preservar sua identidade original.
O homem, ao longo dos séculos, "reinventou" o evangelho dando a ele um "design" mais atraente e criou um novo evangelho, o New Gospel. Este New Gospel a que me refiro não é a respeito de uma única teologia, mas tudo aquilo que é fingidamente "baseado" nas escrituras e/ou distorce o seu real significado. E não importa se a novidade tem 20, 100 ou 200 anos, considero-a como nova em relação à original.

O Fusca era um carro direcionado pro povo, sem distinção e com preço mais acessível. O Evangelho foi e é direcionado a todos, sem acepção nem privilégios. O preço da salvação já foi pago na cruz, nada que façamos compra a salvação e nem a bênção.
 O New Beetle é direcionado pra quem pode pagar mais. O New Gospel também muitas vezes é direcionado a quem pode mai$, é perceptível uma ênfase para atrair gente com mais poder aquisitivo, haja vista os "cultos dos empresários" que temos em algumas igrejas por aí. As bênçãos há muito são vendidas e agora até a salvação dos nossos familiares pode ser comprada.

No Fusca você se sente normal, comum. No Evangelho você se sente igual a todos os outros, parte do corpo de Cristo, amado e valorizado pelo Senhor e Criador de tudo.
No New Beetle você se sente acima, é um privilegiado, diferenciado dos demais. No New Gospel o "servo(a) de Deus" muitas vezes se acha o máximo, talvez o super-héroi mais vitorioso do universo, sua fé poderosa e sua (pseudo)santidade são o seu diferencial e o colocam num patamar mais elevado em relação aos demais. Sem contar nos cada vez mais numerosos "filhos do Rei", que já exigem antes da hora da partilha a sua parte na herança (riquezas) do "papai" dono do outro e da prata, tudo pra ostentar status ou viver regaladamente, pura ganância claramente incentivada. Ignoram que Jesus ensinava justamente a não acumular riquezas na terra, mas no céu.

O Fusca é desconfortável. O Evangelho, embora maravilhoso, não nos deixa confortáveis com nós mesmos; ele sempre nos inquieta, nos perturba com nossas imperfeições a fim de que façamos algo pra mudar o que há de errado em nós. Ele também nos tira de nossa zona de conforto pra fazer a vontade de Deus em detrimento na nossa.
O New Beetle é confortável, aconchegante. O New Gospel faz de tudo pra agradar o ser humano, pra deixá-lo confortável em toda situação. Se há alguma renúncia ou sacrifício pessoal, eles são simplesmente visando uma recompensa que irá melhorar a vida, é uma troca. O arrependimento também se tornou desnecessário e até adotou-se o pensamento pós-moderno de que tudo que fizemos de errado foi bom, pois serviu de aprendizado para o futuro. A sensação de bem-estar pessoal dita as regras, o parâmetro de avaliação não é a verdade da Palavra, mas "se você está se sentindo bem, então está tudo bem".

O Fusca não corre muito, mas chega lá. O Evangelho nos ensina que o nosso tempo não é o tempo de Deus, e que muitas vezes temos que esperar bastante até que a súplica seja atendida ou até mesmo que nosso coração se transforme antes de receber.
O New Beetle é veloz, seu motor responde mais rápido. O New Gospel é apressado como o mundo moderno, não sabe esperar e ainda determina o tempo exato que Deus deve responder ou agir. A pressa é tanta que parece que a eternidade já é aqui neste mundo.

O Fusca não tinha ar condicionado, o passageiro tinha que enfrentar o calor da rua. O Evangelho nos desafia a enfrentar a "rua" sem nos conformarmos com a mentalidade da sociedade à nossa volta, ele não nos condiciona ao mundo, na verdade ele nos separa do mundo (santidade de vida) e ao mesmo tempo nos mantém inseridos nele pra agir diferente, pra dar exemplo. Jesus não se isolou com seus discípulos, ele enfrentou e venceu o mundo.
O New Beetle tem ar condicionado, te isola do calor da rua. O New Gospel em muitos casos condiciona a pessoa a viver no ambiente "perfeito", se isolando nos seus "vidros doutrinários" enquanto o mundo, distante, pega fogo lá fora. Este isolamento não contribui para o crescimento do Reino, é uma forma egoísta e covarde de viver o evangelho. Tem gente no bairro e na cidade padecendo necessidade e a maioria se preocupa apenas com sua fé morta (sem obra, principalmente social).

O Fusca é simples, o motorista não é dependente de computador central pra usar o veículo. O Evangelho é simples, sua essência é clara e objetiva: o amor, o arrependimento, a graça salvadora e o perdão. Deus está acessível, Jesus tornou o acesso ao Pai possível, "manual" (palpável), não dependemos de um outro homem mais "ungido" ou mais "poderoso" pra interceder a Deus por nós, nem de que ele determine nossas escolhas até sobre coisas simples da vida.
O New Beetle vem cheio de aparatos tecnológicos, tudo dependente da central. O New Gospel agregou a si doutrinas humanas, sincretismos religiosos, crendices populares e até pensamentos antropocêntricos para dar um aspecto de modernidade. Há também uma certa dependência espiritual do líder, a bênção e palavra do mesmo é o que faz a diferença na vida da pessoa, fazendo dele (o líder) muitas vezes o único canal entre o céu e o milagre.


Para muitos o New Gospel pode até parecer "melhor", mas ele é uma catástrofe que mancha a imagem do legítimo evangelho, afastando muitas pessoas do verdadeiro conhecimento da cruz e guiando cegos a um precipício. Temos que andar em novidade de vida, não em novidade de doutrina e nem em busca de uma nova revelação acerca do ser de Deus. Ele já se revelou em sua Palavra.

Eu não troco o bom e velho evangelho por nada, ainda que ele seja considerado decadente ou fora de moda. Verdadeiro só tem um.